terça-feira, 19 de abril de 2011

Café sempre esteve entre minhas bebidas preferidas. Pequenininha, contam que, ao contrário das outras crianças da família, trocava o chocolate em pó por café para temperar o leite de todo dia. E não podia ser solúvel ou estar antigo na garrafa. Quantas vezes, antes de dormir, sentei na escada que separava a sala da cozinha, de ''paninho'' e boneca na mão, para fiscalizar meu pai preparando a bebida fresquinha para o leite da minha mamadeira.

Neta de cafeicultor, também lembro da rotina do cafezal nas brincadeiras de infância. Com os primos, a diversão era o esconde-esconde entre as plantas, escolhendo os arbustos mais cheios para desaparecer das vistas do ''pegador''. O nonno, tentando evitar que destruíssemos seu ganha-pão, dizia que ainda íamos pisar em cobra. A ameaça não valia nada. A possibilidade de encontrar o réptil, aliás, só aumentava a adrenalina da brincadeira.

Depois da colheita, a briga para ajudar a mexer o café espalhado no terreiro sempre favorecia os mais novos. Quem ficava por último sentava no murinho e esperava a vez, passando os pés descalços sobre os pequenos montes de grãos. Antes de vender a safra, o nonno separava as sacas que seriam usadas para abastecer a família. Durante toda minha infância e adolescência, o café consumido em casa foi torrado no quintal e moído no porão dos meus avós.

Sábado, antes de comprar gibi na banca do Prioste, a obrigação era moer o café da semana. Meu pai fazia a maior parte do trabalho, mas eu e meu irmão nos revezámos no moedor manual que, substituído por um equipamento elétrico, até hoje enfeita uma das prateleiras do armário da cozinha.

No inverno, os dias mais frios eram também de mobilização. Pai e tio, professores vindos da zona rural, chegavam da escola e iam pro sítio ajudar a proteger o cafezal. Nos anos de safra cheia, a torcida pelas temperaturas mais quentes era intensa. Se chegava a geada, o jeito era cuidar das mudas e esperar que o prejuízo não fosse tão grande.

O tempo passou, deixei minha cidade natal para estudar em Londrina e por aqui fiquei. O café, entretanto, continua fazendo parte dos meus hábitos mais arraigados, seja para acordar de manhã, organizar as ideias no meio do dia ou brindar a presença de alguém querido. Por isso, se eu te convidar para minha casa, você já sabe. Vou te receber na cozinha com um café fresquinho, que será desgustado na mesa com bolo caseiro, enquanto teremos um dedo de prosa.
(Publicada da Folha Rural, da Folha de Londrina, no dia 16/04/2011)

3 comentários:

Alan Santoro disse...

Nasci bem depois que o café começou a ser erredicado aqui no Paraná.Porém, a história de minha família se confunde com a do café aqui no Brasil. Não sei sei se influência ou puro paladar...mais me vi no conto! No quintal da minha infancia sempre exixtiram pás da fruta, por entre os quais brincavamos. O tempo passa e cada dia mais me apaixono por estes sabores de saudade e de café.

Obrigado pela massagem na memória! Belo conto

M. Roggero disse...

Adorei!
Lá em casa tem café do sítio, que o seu pai deu!
É uma delícia mesmo!!!

MegMarques disse...

HUmm, pois eu vou adorar te visitar! Um bom café está entre os meus prazeres preferidos!

bjs