domingo, 24 de abril de 2011

_ Daí que quando eu era criança, se empanturrar de chocolate significava comer um ovo de páscoa inteiro e no máximo dois ou três coelhos ganhos das avós e tias. Acabava tudo em menos de uma semana. As meninas ganharam juntas DOZE ovos de páscoa, fora os brindes da escola e as caixas de bombons. Alguém me diz o que fazer com isso?

_ Pior que elas tiram aqueles brinquedinhos infames de dentro dos ovos e esquecem o chocolate na geladeira. E os pais passam semanas lembrando de comer um pedacinho toda vez que passam pela cozinha. #dietadasnotasfail

_ E minha mãe, na lotérica, querendo discutir a verdadeira natureza das relações entre Jesus Cristo e Maria Madalena?

_ Na terra do chão quente, a menina de quintal não se adapta ao apartamento dos avós e faz todo tipo de traquinagens. Na sexta, pegou a caneta hidrocor mais fuleira e se pintou como "os índios da aldeia". E dá-lhe bucha vegetal para tirar toda aquela tinta chinesa.

_ No dia seguinte, com as mãos sujas de chocolate, ela carimba toda a parede da sala e vem contar, faceira, que aquelas são as marcas do "coelhinho". E dá-lhe bucha com multiuso para tirar o rastro pascoal.

_ Por fim, derruba suco, chocolate, leite, bacalhau, feijão e um pouco de cada coisa que comeu nas cadeiras de jantar da vovó. E dá-lhe bucha com limpa-carpete para minimizar as manchas.

_ Resumindo, feriado das buchas.

_ E com minha nova prática de assistir House tudo de uma vez, direto no computador, fiquei sem poder avançar na sétima temporada durante os quatro dias fora de casa. Deu síndrome de abstinência.

_ Post "diarinho", eu sei. Mas é que minha vida é mesmo sem graça na maior parte do tempo.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Café sempre esteve entre minhas bebidas preferidas. Pequenininha, contam que, ao contrário das outras crianças da família, trocava o chocolate em pó por café para temperar o leite de todo dia. E não podia ser solúvel ou estar antigo na garrafa. Quantas vezes, antes de dormir, sentei na escada que separava a sala da cozinha, de ''paninho'' e boneca na mão, para fiscalizar meu pai preparando a bebida fresquinha para o leite da minha mamadeira.

Neta de cafeicultor, também lembro da rotina do cafezal nas brincadeiras de infância. Com os primos, a diversão era o esconde-esconde entre as plantas, escolhendo os arbustos mais cheios para desaparecer das vistas do ''pegador''. O nonno, tentando evitar que destruíssemos seu ganha-pão, dizia que ainda íamos pisar em cobra. A ameaça não valia nada. A possibilidade de encontrar o réptil, aliás, só aumentava a adrenalina da brincadeira.

Depois da colheita, a briga para ajudar a mexer o café espalhado no terreiro sempre favorecia os mais novos. Quem ficava por último sentava no murinho e esperava a vez, passando os pés descalços sobre os pequenos montes de grãos. Antes de vender a safra, o nonno separava as sacas que seriam usadas para abastecer a família. Durante toda minha infância e adolescência, o café consumido em casa foi torrado no quintal e moído no porão dos meus avós.

Sábado, antes de comprar gibi na banca do Prioste, a obrigação era moer o café da semana. Meu pai fazia a maior parte do trabalho, mas eu e meu irmão nos revezámos no moedor manual que, substituído por um equipamento elétrico, até hoje enfeita uma das prateleiras do armário da cozinha.

No inverno, os dias mais frios eram também de mobilização. Pai e tio, professores vindos da zona rural, chegavam da escola e iam pro sítio ajudar a proteger o cafezal. Nos anos de safra cheia, a torcida pelas temperaturas mais quentes era intensa. Se chegava a geada, o jeito era cuidar das mudas e esperar que o prejuízo não fosse tão grande.

O tempo passou, deixei minha cidade natal para estudar em Londrina e por aqui fiquei. O café, entretanto, continua fazendo parte dos meus hábitos mais arraigados, seja para acordar de manhã, organizar as ideias no meio do dia ou brindar a presença de alguém querido. Por isso, se eu te convidar para minha casa, você já sabe. Vou te receber na cozinha com um café fresquinho, que será desgustado na mesa com bolo caseiro, enquanto teremos um dedo de prosa.
(Publicada da Folha Rural, da Folha de Londrina, no dia 16/04/2011)

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Minha casa é daquelas antigas, de cômodos amplos, azulejos desenhadinhos e piso de taco no chão. O muro da garagem está todo descascado. Precisa de pintura, mas só compensa fazer o serviço se o vizinho arrumar a infiltração do outro lado.
Na parede embaixo da janela da sala, que sempre foi a porta de entrada da gata Chuchu, há várias marcas de patinhas. Na janela ao lado, do quarto das meninas, um expositor de bonés quadriculado, sem os apoios para os acessórios, foi estrategicamente colocado para evitar os pulos da gata na cama da criança que tem asma.
O pé de acerola, gigante, com folhas saindo pelo portão, denuncia a falta de poda. Também próximo à grade, o pé de mamão faz sombra no limoeiro infelizmente destruído pela cachorra Lila. Debaixo dessa árvore, um novo pé de limão começa a nascer, mostrando que o time das frutas cítricas continua no páreo. Por artes dos passarinhos, há um pequeno mamoeiro nascendo em um buraco no cimento do quintal dos fundos, bem ao lado do indescritível quartinho de bagunça.
Dentro de casa, a pia da cozinha, anterior à minha família, nunca foi trocada porque temos causas mais urgentes. Os armários são todos brancos, mas os diferentes puxadores indicam variadas histórias. Tem o paneleiro dos meus tempos de república, a peça que comprei da Mari quando ela se mudou, um modelo de parede feito sob medida para o apartamento da avenida São João... E a mesa, essa sim comprada especificamente para a atual cozinha, que me vi obrigada a providenciar quando dei conta que a família era maior que a mesinha redonda de quatro cadeiras de 1998.
Na sala, o aparador é na verdade um antigo expositor da Garageland. Sobre ele, presentes, fotos, bonequinhos, lembranças de viagens, revistas, um pote cheio de conchas de São Chico. Sofá, estante, uma TV de 20 polegadas, cortinas feitas pela amiga da mãe e uma caixa de ferramentas cheia de jogos e acessórios para Wii dividem espaço com livros abertos largados no chão, desenhos, chinelinhos escondidos nas frestas (que a família inteira procura até alguém lembrar do esconderijo da pequena), copos plásticos abandonados na mesinha de canto, cola, tesoura, gibi... A cada limpeza, os objetos são devolvidos aos lugares. E, a cada minuto depois, retornam magicamente aos espaços de onde foram retirados.
No quarto dos pais, cama e o "home office" da mãe - com mesa e armário - às vezes viram cabides de roupas espalhadas, livros já lidos e não guardados, celulares perdidos, papeizinhos com anotações importantes, "o chapéu mais bonito da Polly que eu nunca mais achei", etc, etc.
No quarto das filhas, a aparente bagunça esconde, na verdade, uma rotina de brincadeiras permeada por momentos de introspecção. O guarda-roupas de bebê entulhado de brinquedos, que incomoda absurdamente os adultos, não consegue ser substituído. Ninguém na casa idealizou, ainda, um móvel mais funcional para acomodar no mesmo lugar objetos tão diversos como bolas, bolsas cheias de barbies, patins, saco de fantasias, roupas de bonecas, posto de gasolina, carrinhos, ursinhos, bonequinhos e todo tipo de inhos da misteriosa vida das meninas.
Você pode achar que minha casa é uma bagunça. Que somos desorganizados ou até mesmo relaxados. Que não cuidamos do local onde moramos. Não é nada disso. Minha casa, como muitas que conheço, é orgânica. Tem um jeito próprio de funcionar, impossível de ser posto em prática nas casas dos anúncios de mobília. Tem móveis velhos, coisas foras do lugar, louça suja na pia, toalha molhada no banheiro, roupa no cesto sem lavar. Mas é também uma casa que tem vida...